A Inclusão dos Créditos Presumidos de ICMS na Base de Cálculo do PIS/PASEP e da COFINS – RE 835.818
por Leonardo Homsy
Sócio de Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr.
Quiroga Advogados
Isaque Brasil
Advogado de Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr.
Quiroga Advogados
1. COMENTÁRIOS PRELIMINARES
A outorga de crédito presumido de ICMS constitui prática recorrente dos Estados e do Distrito Federal, com o intuito de atrair ou manter investimentos em seus respectivos territórios.
A controvérsia que se enfrenta é se os referidos créditos representam receitas tributáveis pelas contribuições ao PIS/Pasep e da COFINS; ou, diversamente, se representam incentivos fiscais ou subvenções não compreendidos no escopo de incidência de tais contribuições.
Não obstante a recente exegese das autoridades fiscais vinculadas à Receita Federal do Brasil (“RFB”) pela inclusão de créditos presumidos de ICMS na base de cálculo do PIS/Pasep e da COFINS, o histórico jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) é favorável ao contribuinte (em que pese passar ao largo da caracterização do crédito presumido como subvenção para custeio ou investimento).
Aguarda-se, no momento, que o Supremo Tribunal Federal (“STF”) julgue de forma definitiva a controvérsia no âmbito do Recurso Extraordinário nº 835.818, cuja repercussão geral foi reconhecida e decisão será vinculante para os demais órgãos administrativos.
Ocorre que referido julgamento será realizado com base em legislação que precede às alterações promovidas pela Lei n. 12.973 de 13.05.2014 (“Lei nº 12.973/2014”) e, possivelmente, sem analisar a controvérsia tributária relativa às subvenções (para custeio ou investimento), pelo que se coloca como reflexão se o STF efetivamente colocará uma pá de cal sobre a controvérsia aqui exposta, mormente quanto aos créditos presumidos de ICMS outorgados pelos Estados após vigência da referida Lei.
2. CASO PARADIGMA – RE 835.818
2.1. DESCRIÇÃO DO CASO PARADIGMA
O caso que aqui se coloca como paradigma teve origem com a impetração de mandado de segurança pela OVD Importadora e Distribuidora Ltda. objetivando, em suma, que a RFB não incluísse na base de cálculo do PIS/Pasep e COFINS os valores relativos aos créditos presumidos de ICMS concedidos pelos Estados do Paraná e Bahia, decorrentes de importação de mercadorias para revenda, sob a alegação de não representarem ingresso de receita mas tão-somente benefício fiscal não passível de tributação pelas referidas contribuições[1].
Em vista da sentença favorável obtida pela OVD Importadora e Distribuidora Ltda., a Fazenda Nacional interpôs apelação ao órgão colegiado, sob o fundamento de que os créditos presumidos de ICMS configuram receita e, como tal, devem ser incluídos na base de cálculo das contribuições para o PIS/Pasep e da COFINS já que incidem sobre o total de receitas auferidas independentemente de sua denominação ou classificação contábil.
A 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negou provimento à apelação interposta pela União, por entender que o crédito presumido de ICMS analisado não constituiria receita tributável pelo PIS/Pasep e COFINS, mas mera renúncia fiscal, cujo objetivo era incentivar o desenvolvimento de determinados setores da economia, gerando importantes reflexos financeiros e sociais para o desenvolvimento do próprio Estado.
O Tribunal consignou, ainda, que eventual inclusão da referida subvenção na base de cálculo das contribuições ao PIS/Pasep e da COFINS autorizaria a interferência da União na competência tributária privativa dos Estados ao minorar a eficácia de benefícios fiscais pretendidos, fato que resultaria em ofensa ao princípio federativo.
A Fazenda Nacional interpôs Recurso Especial ao STJ, o qual foi inadmitido na origem e cujos agravos interpostos foram igualmente negados.
Em vista do Recurso Extraordinário interposto pela Fazenda Nacional, rogando-se ofensa aos artigos 150, § 6º, e 195, inciso I, alínea b, da Constituição Federal, aguarda-se a inédita apreciação da matéria pelo STF, cuja repercussão geral foi reconhecida em virtude de o tema transcender o interesse subjetivo das partes e se mostrar relevante do ponto de vista econômico, político, social e jurídico.
2.2. COMENTÁRIOS AOS CRÉDITOS PRESUMIDOS DE ICMS
Em simples resumo, os créditos presumidos de ICMS configuram técnica de incentivo fiscal por meio da qual se faculta que créditos “fictícios”, normalmente obtidos mediante aplicação de determinada porcentagem (alíquota) sobre as operações praticadas, sejam lançados em conta gráfica de apuração do ICMS de forma a resultar uma redução do ICMS devido no mês.
A controvérsia em comento, que não é recente tampouco esporádica, centra na natureza do crédito presumido de ICMS e na definição da base de cálculo das contribuições ao PIS/Pasep e da COFINS.
As autoridades fiscais vinculadas à RFB vêm atribuindo aos créditos presumidos de ICMS a natureza de subvenção para custeio de forma a exigir que a respectiva receita, por ausência de norma desonerativa específica, seja incluída na base de cálculo das contribuições ao PIS/Pasep e da COFINS (e.g. soluções de consulta nº 336/2014 e 188/2015).
Este posicionamento, entretanto, não é acompanhado pelo STJ, o qual inaugurou o debate em 2008 ao analisar crédito presumido de ICMS outorgado pelo Estado do Rio Grande do Sul e concluir que o referido crédito, por não se tratar de receita, não deveria ser incluído na base de cálculo do PIS/Pasep e da COFINS[2].
No entender do STJ, independentemente da classificação contábil que é dada, os referidos créditos escriturais não se caracterizam como receita, porquanto inexiste incorporação ao patrimônio das empresas e repasse dos valores aos produtos e ao consumidor final, tratando-se, pois, de mero ressarcimento de custos.
Note que, neste caso específico, o relatório do acórdão demonstra que o recorrente alegava ofensa aos artigos 2º e 3º Leis nº 9.718 de 27.11.1998 (“Lei nº 9.718/1998”), mas também ao artigo 1º, § 2º, das Leis 10.637 de 30.12.2002 (“Lei nº 10.637/2002”) e 10.833 de 29.12.2003 (“Lei nº 10.833/2003”),
Com efeito, o posicionamento acima vem sendo reiteradamente ratificado pelo STJ. Em um dos mais recentes acórdãos sobre a matéria, esclarece-se que “a jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que o crédito presumido referente ao ICMS não tem natureza de receita ou faturamento, razão pela qual não pode ser incluído na base de cálculo do PIS e da Cofins. Incide, pois, na hipótese o enunciado da Súmula 83/STJ.“[3]
Ora, incidindo as contribuições ao PIS/Pasep e a COFINS sobre receitas e possuindo o crédito presumido de ICMS natureza de recuperação de custo, compartilhamos do entendimento do STJ acima indicado no sentido de não ser possível a inclusão dos referidos créditos nas bases de cálculo dessas contribuições.
Melhor explicando, conforme delimita o artigo 195, I, da Constituição Federal, a União possui competência para instituir contribuições sociais (do empregador, da empresa ou equiparada) incidentes sobre receita ou faturamento, pelo que as contribuições ao PIS/Pasep e a COFINS somente podem incidir sobre tais materialidades[4].
Muito se discutiu (e se discute) sobre o alcance dos termos receita e faturamento.
O STF, interpretando os referidos conceitos à luz da constituição, consignou que o termo faturamento corresponde à receita bruta auferida pela empresa decorrente da venda de bens ou da prestação de serviço. Foi por este motivo que declarou a inconstitucionalidade do §1º do artigo 3º da Lei nº 9.718/1998 que previa incidir o PIS/Pasep e COFINS sobre a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica independe da atividade por ela exercida[5].
Já sobre o conceito de receita, as Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003 definiram esta como compreendendo não só a receita bruta decorrente da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia, mas todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica – conforme redação vigente antes das alterações promovidas pela Lei nº 12.973/2014. Note que a legislação optou pelo termo “receitas auferidas”, pelo que há o entendimento de ter a legislação delimitado o conceito de receita àquela decorrente dos negócios jurídicos praticados pela pessoa jurídica, i.e. do exercício da atividade empresarial.
Neste sentido, esclarece José Antonio Minatelque “auferir receita é a conduta que evidencia e viabiliza a obtenção do ingresso, materializada pela entrada de recursos financeiros remuneradores dos diferentes negócios jurídicos da atividade empresarial”.
Ademais, a nosso ver, receita deve necessariamente representar um elemento novo que repercute positivamente no patrimônio líquido da pessoa jurídica. Assim, não são todos os ingressos financeiros ou lançamentos contábeis indicativos de crédito que possuem o condão de representar receita para o contribuinte que os recebe; mas tão-somente aqueles que resultam em um incremento no patrimônio líquido capaz de revelar capacidade contributiva[6].
O conceito acima é corroborado por vasta doutrina. Ricardo Mariz de Oliveira, por exemplo, define receita como sendo algo novo, representando um plus jurídico que se agrega ao patrimônio[7]. Aliomar Baleeiro, ensina que receita é a entrada que, integrando-se ao patrimônio sem quaisquer reserva ou condições, vem acrescer seu vulto, como elemento novo positivo[8]. Ives Gandra da Silva Martins, por sua vez, leciona que somente os recursos que passem a fazer parte do patrimônio do contribuinte podem ser considerado receita, sendo este conceito, para fins de incidência de PIS/Pasep e COFINS, substancial (jurídico) e não contábil[9].
Ainda sobre o alcance do termo receita, Marco Aurélio Greco, analisando a Constituição Federal, nota que no âmbito das contribuições sociais, a movimentação financeira e receita/faturamento são conceitos distintos, sendo a primeira pressuposto da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, motivo pelo qual não se poderia dar à palavra “receita” um sentido que possibilite abranger toda e qualquer movimentação financeira ou de créditos[10].
Decorre do conceito acima comentado que a recuperação de custo não representaria receita pela inexistência de ingresso novo, ou efetivo incremento do patrimônio líquido do contribuinte.
Neste sentido, lembra José Antonio Minatel que, enquanto há o reconhecimento de não incidência de PIS/Pasep e COFINS sobre valores recuperados a título de tributo pago indevidamente, “equivoca-se no entendimento de que os valores ressarcidos a título de crédito presumido são passíveis de tributação, pela falsa premissa de estarem abrangidos pelo conceito de receita, pois se caracterizam, também, recuperação de custos”[11].
Aliás, o mesmo autor sustenta que os efeitos da recuperação de custos são os mesmos das indenizações reparatórias, pela similitude no caráter de recomposição patrimonial e ausência de nova riqueza[12].
Não obstante o acima comentado, dois aspectos merecem destaque.
A uma, as regras de base de cálculo do PIS/Pasep e COFINS vigentes à época dos casos levados à apreciação do STJ (e STF) foram alteradas com o advento da Lei nº 12.973/2014.
A duas, o STJ, em seus precedentes, vem passando ao largo da caracterização do crédito presumido do ICMS como subvenção (para custeio ou investimento), concluindo pela não incidência do PIS/Pasep e COFINS exclusivamente sob a ótica de os benefícios fiscais em tela representarem mera recomposição ou ressarcimento de custos.
Em que pese entendermos que o argumento de os créditos presumidos não constituírem receita tributável pelo PIS/Pasep e COFINS encerra a controvérsia em comento, é de se notar que o escopo de análise realizado pelo STJ diverge do que vem sendo adotado pelas autoridades fiscais da RFB, que repetidamente baseiam suas conclusões nos aspectos tributários relativos às subvenções – como se verá mais adiante.
Assim, o ponto que merece reflexão é se o julgamento do STF sobre a matéria efetivamente sobrestará os anseios fiscalizatórios contra contribuintes que não incluírem os créditos presumidos de ICMS na base de cálculo do PIS/Pasep e COFINS, (i) após vigência da Lei nº 12.973/2014 e (i) independentemente da controvérsia tributária que circunda o instituto da subvenção.
Naturalmente, trata-se de dúvida que somente o tempo responderá. Em todo caso, sem a pretensão de se esgotar a matéria, apresentamos a seguir alguns breves comentários sobre as alterações promovidas pela Lei nº 12.973/2014, inclusive quanto à controvérsia relativa às subvenções (custeio e investimento).
2.3. CONCEITO DE RECEITA APÓS LEI Nº 12.973/2014
Como já mencionado, a legislação do PIS/Pasep e da COFINS estabelece que estas contribuições incidem sobre a receita auferida.
Como muito se noticiou, o conceito de receita para fins de PIS/Pasep e COFINS foi substancialmente alterado (e ampliado) pelas novas regras introduzidas pela Lei nº 12.973/2014, conversão da Medida Provisória nº 627, de 11 de novembro de 2013, com o objetivo de encerrar antigas discussões sobre a matéria.
Nos exatos termos da legislação que rege as contribuições ao PIS/Pasep e a COFINS, conforme alterada pela Lei nº 12.973/2014, incidem as contribuições: (i) no caso da Lei nº 9.718/1998 (regime cumulativo) sobre “a receita bruta de que trata o art. 12 do Decreto-Lei nº 1.598, de 26 de dezembro de 1977” (regime cumulativo); ou, em relação às Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003 (regime não-cumulativo), sobre (ii) “a receita bruta de que trata o art. 12 do Decreto-Lei no 1.598, de 26 de dezembro de 1977, e todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica com os seus respectivos valores decorrentes do ajuste a valor presente (…)”.
De acordo com o novo conceito, a receita bruta prevista no referido artigo 12 do Decreto-Lei nº 1.598, de 26 de dezembro de 1977 passou a compreender não só o produto da venda de bens nas operações de conta própria e o preço dos serviços prestados, como (i) o resultado auferido nas operações de conta alheia e (ii) as receitas das demais atividades ou objetivo principal da pessoa jurídica.
Aqui, não nos parece que a análise realizada pelo STJ quanto à caracterização do crédito presumido de ICMS como recomposição/ressarcimento de custos reste prejudicada em vista das novas regras trazidas pela Lei nº 12.973/2014. Isso porque, independentemente das alterações, o posicionamento do STJ converge no sentido de que os referidos créditos, seja qual for o tratamento contábil conferido, jamais poderiam ser enquadrados no conceito de receita para fins de incidência de PIS/Pasep e COFINS. Consequentemente, eventual julgamento do STF nesse sentido também não nos parece ser afetado pelas novas regras.
Em todo caso, não se pode ignorar o risco de as autoridades fiscais continuarem com a pretensão de, transversalmente, enquadrar os créditos presumidos de ICMS no conceito de subvenções (custeio ou investimento). Neste cenário, contrariamente ao que defendemos, não resta claro se o julgamento a ser proferido pelo STF de fato sepultará o anseios fiscalizatórios atinentes à matéria em comento. Por este motivo, novamente sem a pretensão de esgotar o tema, é que passamos para o próximo ponto de reflexão.
2.4. CRÉDITOS PRESUMIDOS DE ICMS E SUBVENÇÕES
Como acima demonstrado, o crédito presumido de ICMS configura técnica de incentivo fiscal que resultam em uma redução do ICMS devido.
Por estar-se diante de auxílio oferecido pelo Poder Público, os créditos presumidos de ICMS caracterizam como subvenções que, na definição de Celso Antônio Bandeira de Mello e Geraldo Ataliba, consiste em direito estabelecido por lei a perceber do Poder Público determinada ajuda ou auxílio pecuniário[13].
Com efeito, a natureza dos créditos presumidos de ICMS como subvenções há muito vem sendo ressaltada pelas autoridades fiscais.
O intenso debate que se coloca, na verdade, é se os referidos créditos presumidos configuram subvenções para investimento, que consistem em incentivos a setores econômicos ou regiões com o intuito de estimular à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos que comportem interesse especial; ou subvenção para custeio, que objetiva o auxílio financeiro às empresas para suportar suas despesas usuais e a executar o seu objeto social. Isso porque, cada uma dessas modalidades de subvenção possui tratamento contábil e tributário específico.
Sob o aspecto contábil-tributário, o Decreto-Lei nº 1.598, de 26.12.1977 estabelecia que as subvenções para investimento, inclusive mediante isenção ou redução de impostos concedidos como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos, deveriam ser contabilizadas como reserva de capital e não integram o cômputo da determinação do lucro real.
Justamente pelo fato de as subvenções para investimento serem creditadas em conta de reserva de capital (e não transitar em conta de resultado), não possuindo assim características de receita, havia o entendimento de que referidas subvenções não estariam sujeitas ao PIS/Pasep e a COFINS, cujas bases de cálculo, como se viu, consideram a receita (bruta ou total, conforme o caso) da pessoa jurídica.
Com as alterações promovidas na legislação tributária com o objetivo de adequá-la à legislação societária e contábil atualmente em vigor, notadamente pelas Leis nº 11.638 de 28.12.2007, 11.941 de 27.05.2009 e mais recentemente pela Lei nº 12.973/2014, as subvenções para investimento permaneceram fora do cômputo da determinação do lucro real, não obstante passarem a transitar em conta de resultado como receitas e contabilizados em conta de reservas de lucro.
Especificamente quanto ao PIS/Pasep e COFINS, a referida Lei nº 11.941 previa que, para fins de aplicação do Regime Tributário de Transição (“RTT”), poderiam ser excluídos da base de cálculo dessas contribuições, quando registrados em conta de resultado, o valor das subvenções para investimento feitas pelo poder público.
Extinguindo o RTT, a Lei nº 12.973/2014 alterou as Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003 de forma que, pela primeira vez, a legislação de regência de PIS/Pasep e COFINS passou a prever expressamente a não inclusão dos valores referentes às subvenções para investimentos nas bases de cálculo de ambas as contribuições – quando apuradas pelo regime não-cumulativo. Neste ponto, muitos indagam se a intenção legislativa de prever expressamente a não tributação pelo PIS/Pasep e COFINS das subvenções para investimento somente no regime não-cumulativo foi de tributar estas subvenções quando apuradas no regime cumulativo; ou de presumir a impossibilidade de tributação das subvenções para investimento no regime cumulativo vis-à-vis o conceito de receita acima comentado.
A subvenção para custeio, por sua vez, integra a receita bruta operacional (artigo 44 da Lei nº 4.506, de 30.11.1964), não tendo sido esta modalidade de subvenção afetada pelas novas regras mencionadas acima.
Especificamente quanto ao PIS/Pasep e COFINS, não há norma que exclua as subvenções para custeio das bases de cálculos das referidas contribuições. Há quem questione se as subvenções para custeio configurariam receitas financeiras e, assim, beneficiariam do tratamento a elas aplicáveis pela legislação do PIS/Pasep e COFINS.
Finalizando o arcabouço legislativo, a Instrução Normativa (“IN”) 1.556, de 31.03.2015, incluiu o §7º ao artigo 112 da IN 1.515, de 24.11.2014, que disciplinou a Lei nº 12.973/2014, para vedar a exclusão na apuração do lucro real da subvenção recebida do Poder Público, em função de benefício fiscal, quando os recursos puderem ser livremente movimentados pelo beneficiário – isto é, quando não houver obrigatoriedade de aplicação da totalidade dos recursos na aquisição de bens ou direitos necessários à implantação ou expansão de empreendimento econômico, inexistindo sincronia e vinculação entre a percepção da vantagem e a aplicação dos recursos.
A nosso ver, a IN, ao incluir a vedação acima, acabou por confirmar o entendimento já antes manifestado pelas autoridades fiscais quanto às subvenções para investimento, notadamente através do Parecer Normativo nº 112/78 (“PN-CST nº 112/78”) e recentes soluções de consultas sobre o tema (e.g. Solução de Consulta COSIT nº 336, de 12.12.2014).
Este entendimento, entretanto, por exigir requisitos além dos previstos na lei tributária no que tange à subvenção para investimento é fortemente rechaçado por emérita doutrina, dos quais somos partidários[14].
Com efeito, há posicionamentos do CARF no sentido de que a verificação do escopo investidor da concessão da subvenção deve ser realizada de maneira abstrata, desvinculada do efetivo emprego dos valores subvencionados, sendo tão-somente relevante a intenção do ente subvencionador para fins de enquadramento do incentivo como subvenção para investimento.
Para exemplificar, no acórdão nº 1101-000.661, de 31.01.2012, consignou o CARF que (i) o crédito presumido de ICMS é essencialmente uma subvenção para investimento; (ii) as subvenções para custeio e investimento diferenciam-se tão somente na medida em que as primeiras são concedidas com o fito de estimular investimentos regionais ou setoriais; (iii) as subvenções para investimento, ao contrário do que dispõe o PN-CST nº 112/78 não pressupõe a aplicação direta e exclusiva das subvenções em projetos predeterminado, sendo irrelevante a análise das contrapartidas impingidas ao contribuinte[15].
Mais recentemente, no âmbito do acórdão nº 1202-001.175, de 29.07.2014, decidiu o CARF que o que se mostra indispensável para a caracterização dos recursos recebidos como subvenção para investimento é o propósito da subvenção, sendo desnecessária a vinculação dos recursos recebidos em empreendimentos.
A nosso ver, parece razoável assumir que as razões de decidir constantes dos acórdãos acima, bem como o racional embasando o posicionamento doutrinário acima indicado, permaneceriam as mesmas caso se estivesse analisando os preceitos da IN 1.515, de 24.11.2014, conforme alterada pela IN 1.515, de 24.11.2014.
3. CONCLUSÃO
Após longo período de debates, espera-se que o STF julgue de forma definitiva sobre a necessidade de inclusão dos créditos presumidos de ICMS na base de cálculo das contribuições ao PIS/Pasep e da COFINS no âmbito do Recurso Extraordinário nº 835.818, cuja repercussão geral foi reconhecida e decisão será vinculante para os demais órgãos administrativos.
A questão central, entretanto, é até que ponto o julgamento do STF sobre a matéria efetivamente freará os anseios fiscalizatórios contra contribuintes que não incluírem os créditos presumidos de ICMS na base de cálculo do PIS/Pasep e COFINS após vigência da Lei nº 12.973/2014 e independentemente da controvérsia tributária que circunda o instituto da subvenção.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
BALEEIRO, Aliomar. Uma introdução à ciência das finanças. 15ª ed. Atualizado por Dejalma de Campos. Rio de Janeiro: Forense, 1997.
GRECO, Marco Aurélio. In Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, vol. 50, p. 129.
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Pis e Cofins – não incidência sobre o reembolso, feito pela empresa de energia elétrica, com recursos da cde (lei 10.438/02 e decreto 4541/02) às usinas termelétricas, do custo do carvão mineral nacional utilizado como combustível – sua não inclusão no conceito de receita, base de cálculo das contribuições objeto do art. 195, i, “b” da cf devidas pela usina – tributação que, ademais, violaria a política pública estabelecida para o setor (lei 10.312/01, que submete a receita bruta do fornecedor desse combustível à alíquota zero, lei 10.438/02 e decreto 4541/02). In. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 122, nov/2005. p. 132-144.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de; ATALIBA, Geraldo. Subvenções. In: Revista de Direito Público, v. 20. Ed. Revista dos Tribunais, 1972, pp. 88-89.
MINATEL, José Antônio, Conteúdo do Conceito de Receita e Regime Jurídico para sua Tributação, MP, 2005, p. 218/219, 222, 224 e 259.
OLIVEIRA, Ricardo Mariz. Conceito de Receita como Hipótese de Incidência das Contribuições para a Seguridade Social (para Efeitos da COFINS e da Contribuição ao PIS). Nº 1/2001 — Caderno 1. São Paulo: IOB, p. 21.
PAULSEN, Leandro. Direito Tributário Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência. Ed. Livraria do Advogado, 16ª edição, página 582.
PEDREIRA, José Bulhões. Imposto sobre a Renda – Pessoas Jurídicas- Vol. 2. Rio de Janeiro: Adcoas, 1979, p. 686.
[1] O caso paradigma refere-se ao constante dos autos do processo de apelação/reexame necessário nº 5014019-74.2010.404.7000/PR. Para fins didáticos, reservamo-nos o direito de apresentar somente os fatos, fases processuais e fundamentos relevantes para fins do presente artigo.
[2] REsp 1.025.833/RS, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 06/11/2008, DJe 17/11/2008.
[3] AgRg no AREsp 661.146/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 18/06/2015, DJe 05/08/2015. Note que a súmula nº 83//93 dispõe que “não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida.
[4] Conforme alteração promovida pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998.
[5] Nesse sentido, nos recursos extraordinários nº 357.950/RS e 358.273/RS, o STF reconheceu que o legislador havia extrapolado o conceito constitucional de faturamento.
[6] Neste mesmo sentido: PAULSEN, Leandro. Direito Tributário Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência. Ed. Livraria do Advogado, 16ª edição, página 582.
[7] OLIVEIRA, Ricardo Mariz. Conceito de Receita como Hipótese de Incidência das Contribuições para a Seguridade Social (para Efeitos da COFINS e da Contribuição ao PIS). Nº 1/2001 — Caderno 1. São Paulo: IOB, p. 21.
[8] BALEEIRO, Aliomar. Uma introdução à ciência das finanças. 15ª ed. Atualizado por Dejalma de Campos. Rio de Janeiro: Forense, 1997.
[9] MARTINS, Ives Gandra da Silva. Pis e Cofins – não incidência sobre o reembolso, feito pela empresa de energia elétrica, com recursos da cde (lei 10.438/02 e decreto 4541/02) às usinas termelétricas, do custo do carvão mineral nacional utilizado como combustível – sua não inclusão no conceito de receita, base de cálculo das contribuições objeto do art. 195, i, “b” da cf devidas pela usina – tributação que, ademais, violaria a política pública estabelecida para o setor (lei 10.312/01, que submete a receita bruta do fornecedor desse combustível à alíquota zero, lei 10.438/02 e decreto 4541/02). In. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 122, nov/2005. p. 132-144.
[10] GRECO, Marco Aurélio. In Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, vol. 50, p. 129.
[11] MINATEL, José Antônio, Conteúdo do Conceito de Receita e Regime Jurídico para sua Tributação, MP, 2005, p. 218/219, 222, 224 e 259.
[12] Idem.
[13] MELLO, Celso Antônio Bandeira de; ATALIBA, Geraldo. Subvenções. In: Revista de Direito Público, v. 20. Ed. Revista dos Tribunais, 1972, pp. 88-89.
[14] José Luiz Bulhões Pedreira, por exemplo, assevera que afirmação do PN-CST nº 112/78 de que só existe subvenção para investimento quando há ‘a efetiva e específica aplicação da subvenção, por parte do beneficiário, nos investimentos previstos na implantação ou expansão do empreendimento econômico projetado’, não tem fundamento legal (PEDREIRA, José Bulhões. Imposto sobre a Renda – Pessoas Jurídicas- Vol. 2. Rio de Janeiro: Adcoas, 1979, p. 686).
[15] Acórdão nº 1101-000.661 de 31 de Janeiro de 2012. 1ª Câmara / 1ª Turma da Primeira Seção de Julgamento.