Nota Pública: posicionamento sobre interpretações recentes do TCU

Nota Pública: posicionamento sobre interpretações recentes do TCU

A ABDF, em conjunto com outras entidades, divulgou Nota Pública para manifestar preocupação com recentes interpretações do Tribunal de Contas da União, que podem impactar a política de transação tributária em âmbito federal. O documento destaca os pontos que devem orientar a análise e a discussão do tema.

A íntegra da Nota Pública pode ser acessada abaixo.

 

NOTA PÚBLICA

As entidades abaixo subscritas, vêm a público manifestar profunda preocupação com as recentes interpretações exaradas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) no âmbito do TC 007.099/2024-0, que põem em risco a continuidade e a efetividade da exitosa política pública de transação tributária federal que vem trazendo resultados expressivos para a arrecadação da União. O instituto da transação, regulamentado pela Lei nº 13.988/2020 e aprimorado pela Lei nº 14.375/2022, representa a mais importante mudança de paradigma na relação fazenda contribuinte das últimas décadas. Retroceder neste modelo seria um erro histórico com
graves consequências fiscais e econômicas.

Apresentamos, a seguir, os pontos fundamentais que devem nortear a compreensão deste
instituto:

1. O Cenário de Irrecuperabilidade Pré-Transação e a Mudança de Paradigma Antes da implementação efetiva da transação tributária

O Brasil convivia com um estoque de Dívida Ativa da União (DAU) que ultrapassa a casa dos trilhões, caracterizado por uma situação de grave irrecuperabilidade. O
modelo anterior, baseado em execuções fiscais massivas e ineficientes, resultava em baixíssima liquidez para o Erário e alto custo de conformidade. O atual modelo,
implementado no contexto crítico da pandemia de COVID-19, rompeu com a lógica dos antigos parcelamentos especiais (“Refis”).

Diferentemente do parcelamento, a transação não é uma benesse generalizada, mas um acordo customizado baseado na capacidade de pagamento e no grau de
recuperabilidade do crédito. Na transação, o interesse público reside na manutenção do acordo e na recuperação da empresa, garantindo o fluxo de pagamento a longo prazo, e não na rescisão sumária que devolve o crédito à vala comum da irrecuperabilidade.

2. A Eficiência Comprovada pelos Números

Os resultados da transação tributária são incontestáveis e demonstram sua eficiência arrecadatória superior a qualquer modelo anterior. Conforme dados oficiais da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) referentes a 2024:

• A recuperação da Dívida Ativa da União atingiu o recorde histórico de R$61,3 bilhões em 2024, um aumento de 20% em relação ao ano anterior e o
dobro do recuperado em 2020.

• Deste montante, R$ 34,1 bilhões são provenientes exclusivamente de acordos de transação tributária.

• Desde 2019, o modelo já permitiu a regularização de R$ 777,1 bilhões em débitos, abrangendo 3,2 milhões de acordos.

Esses números comprovam que a transação não é renúncia de receita, mas sim uma ferramenta eficaz de recuperação de créditos que, de outra forma, seriam
perdidos.

3. A Natureza Jurídica do Prejuízo Fiscal e Base Negativa (PF/BCN): Ativo, não Desconto

Segundo TCU, a utilização de créditos de Prejuízo Fiscal e Base de Cálculo Negativa da CSLL (PF/BCN) constituiria um “desconto” sujeito às travas percentuais da lei, ou uma renúncia de receita. Juridicamente e contabilmente, o PF/BCN é um Ativo Fiscal Diferido, conforme o Pronunciamento Técnico CPC 32. Trata-se de um direito do contribuinte de recompor perdas patrimoniais passadas contra lucros futuros.

Aliás, a Lei nº 13.988/2020, com a redação da Lei nº 14.375/2022 (art. 11, §1º-A), é cristalina ao estabelecer que o PF/BCN é utilizado para amortização do saldo
devedor remanescente após a incidência dos descontos, limitado a 70% desse saldo e, somente se considera como crédito, em média 34% do prejuízo.

Ou seja: (i) aplicam-se os descontos legais; (ii) sobre o saldo, utiliza-se parte do PF/BCN, como se o mesmo estivesse sendo compensado, de acordo com a lei do
IRPJ e da CSLL, como meio de liquidação (pagamento), e não como novo desconto.

Tratar o PF/BCN como desconto não é adequado. Trata-se de um direito líquido e certo do contribuinte, uma “moeda”, que a lei autorizou excepcionalmente para
extinguir débitos irrecuperáveis ou de difícil recuperação.

Impedir seu uso ou limitá-lo não gera arrecadação em dinheiro para a União; apenas mantém o estoque de prejuízos fiscais nas empresas (que seriam usados
no futuro para abater IRPJ/CSLL) e o estoque de dívida na União. A liquidação antecipada via transação é vantajosa para ambos.

4. O Risco de Colapso do Instituto

A insegurança jurídica gerada por interpretações restritivas do TCU pode levar à fragmentação ou descontinuidade da transação tributária. É imperioso destacar que o sucesso da transação tributária federal é amplamente reconhecido, inclusive pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que estimula a autocomposição. O modelo é tão exitoso que inspirou a edição do Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 124/2024, atualmente em fase final de aprovação no Congresso Nacional, que visa instituir normas gerais de transação para todos os entes federativos.

Diante do exposto, as entidades signatárias apelam para compreensão da racionalidade econômica que sustentam a transação tributária. O uso do PF/BCN, dentro dos limites da Lei nº 13.988/2020, é um mecanismo de liquidação de passivo e não de renúncia fiscal. Preservar este instituto é defender o interesse público, a arrecadação eficiente e a conformidade fiscal no Brasil.

Referência: Nota Pública sobre o Acórdão do TCU no processo TC 007.099/2024-0.
Documento assinado pelas entidades subscritoras.

AASP – ASSOCIAÇÃO DOS ADVOGADOS DE SÃO PAULO
ABAT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ADVOCACIA TRIBUTÁRIA
ABDF – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DIREITO FINANCEIRO
APET – ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS
CCMT – CENTRO DE CONSENSUALIDADE EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
CENAPRET – CENTRO NACIONAL PARA PREVENÇÃO E RESOLUÇÃO DE CONFLITOS TRIBUTÁRIOS
CESA – CENTRO DE ESTUDOS DAS SOCIEDADES DE ADVOGADOS
FESDT – FUNDAÇÃO ESCOLA SUPERIOR DE DIREITO TRIBUTÁRIO
GDT – GRUPO DE DEBATES TRIBUTÁRIOS – ESPÍRITO SANTO
IAB – INSTITUTO DOS ADVOGADOS BRASILEIROS
IASC – INSTITUTO DOS ADVOGADOS DE SANTA CATARINA
IASP – INSTITUTO DOS ADVOGADOS DE SÃO PAULO
IAT – INSTITUTO DE APLICAÇÃO DO TRIBUTO
IBAJUD – INSTITUTO BRASILEIRO DA INSOLVÊNCIA
IBET – INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS
IDTP – INSTITUTO DE DIREITO TRIBUTÁRIO DA PARAÍBA
IET – INSTITUTO DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS
IPET – INSTITUTO PERNAMBUCANO DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS
MT – ASSOCIAÇÃO MULHERES NO TRIBUTÁRIO

 

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