Nova Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta – a Compensação da Contribuição Retida na Fonte quando há Cessão de Mão de Obra e o Posicionamento do Fisco

por Cristiane Ianagui Matsumoto Gago
e Fernanda Balieiro Figueiredo
Associadas de Pinheiro Neto Advogados

 

Introdução

O regime da desoneração da folha de salários foi introduzido inicialmente no ordenamento jurídico pela Medida Provisória n° 540, de 3.8.2011 (“Medida Provisória n° 540/2011”). Essa Medida Provisória foi convertida e deu origem à Lei n° 12.546, de 14 de dezembro de 2011 (“Lei nº 12.546/2011”).

Esse novo diploma legal determinou a substituição da contribuição previdenciária patronal de 20% incidente sobre a remuneração paga aos segurados empregados, avulsos e contribuintes individuais (artigo 22, da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991), pela contribuição social incidente sobre receita bruta auferida pelas empresas de determinadas atividades. A medida foi criada visando à formalização das relações de trabalho e ao fomento dessas atividades.

A Lei n° 12.546/2011 tem fundamento de validade na competência tributária conferida à União Federal pela alínea “b” do inciso I do art. 195 da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constituição nº 20, de 15 de dezembro de 1998. Além disso, em 2003, Constituição Federal foi alterada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19 de dezembro de 2003, que incluiu o parágrafo 13º no artigo 195 e autorizou a substituição gradual, total ou parcial, da contribuição do empregador incidente sobre a folha de salário, por contribuição incidente sobre a receita ou o faturamento.

A nova contribuição social sobre a receita bruta não alterou a forma de recolhimento da contribuição ao Seguro Acidente do Trabalho (“SAT”)/Risco Acidente do Trabalho (“RAT”), o índice Fator Acidentário de Prevenção (“FAP”), as contribuições destinadas a Terceiras Entidades e as contribuições devidas pelos segurados empregados, trabalhadores avulsos e contribuintes individuais.

Existe, ainda, a possibilidade de o contribuinte se enquadrar no regime misto, com a conjugação dos dois sistemas de tributação (folha de salários e receita bruta), caso o contribuinte possua receitas provenientes das atividades abrangidas pelo regime da desoneração da folha de salários e receitas de outras atividades. Nessa situação, o contribuinte deverá observar o cálculo proporcional, ou seja: (i) quanto à parcela da receita correspondente à atividade abrangida pela Lei n° 12.546/2011, tributará na sistemática substitutiva (receita bruta); e (ii) quanto à parcela da receita de outras atividades (não enquadradas na Lei n° 12.546/2011), o cálculo será efetuado reduzindo-se o valor da contribuição previdenciária patronal ao percentual resultante da razão entre (ii.1) a receita bruta de outras atividades e (ii.2) a receita bruta total da empresa (matriz e filiais).

Ocorre que várias dúvidas e questionamentos têm surgido nas empresas vinculadas ao sistema substitutivo, no que se refere a sua correta operacionalização. E nesse contexto, abordaremos neste artigo a análise e o posicionamento externado pela Receita Federal do Brasil quanto ao tema “compensação da retenção previdenciária com a contribuição substitutiva instituída pela Lei nº 12.546/2011, incidente sobre a receita bruta”.

Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta e a Retenção Previdenciária

A Lei nº 12.715, de 17 de setembro de 2012 (“Lei nº 12.715/2012”), dentre outras medidas, incluiu o § 6º ao artigo 7º da Lei nº 12.546/2011, para alterar a alíquota aplicável na retenção previdenciária quando há cessão de mão de obra. Assim, no caso de contratação de empresas sujeitas ao regime substitutivo de desoneração da folha de salários para execução de serviços, mediante cessão de mão de obra, a tomadora de serviços passou a ter que reter 3,5% do valor bruto da nota fiscal.

As empresas que prestam serviços de Tecnologia da Informação – TI, Tecnologia da Informação e Comunicação – TIC, Call Center, concepção, desenvolvimento ou projeto de circuitos integrados, setor hoteleiro (subclasse 5510-8/01 da CNAE 2.0) e transporte rodoviário coletivo de passageiros (classes 4921-3 e 4922-1 da CNAE 2.0), com cessão de mão de obra, estão sujeitas à nova alíquota de 3,5%, a título de retenção previdenciária.

Posteriormente, em 28 de dezembro de 2012 foi publicada a Medida Provisória nº 601, que obrigou as empresas contratantes a efetuarem a retenção previdenciária de 3,5% do valor bruto da nota fiscal emitida pelas empresas que prestam serviços de manutenção, reparação de embarcações e varejo (Anexo II da Medida Provisória n° 601/2012), executados mediante cessão de mão de obra.

A legislação que rege a contribuição previdenciária sobre a receita bruta não modifica o procedimento da retenção previdenciária e da compensação/restituição do valor retido pela empresa contratante.

Permanecem válidas, portanto, as regras previstas no artigo 31 da Lei nº 8212/91, o qual determina que a empresa contratante de serviços prestados mediante cessão e/ou empreitada de mão de obra deverá efetuar a retenção e o recolhimento da contribuição previdenciária, sobre o valor da nota fiscal, emitida pela empresa contratada. A empresa contratada, por sua vez, ao efetuar o recolhimento mensal da contribuição previdenciária sobre a folha de salários, poderá abater o valor retido e recolhido pelas empresas contratantes, em seu nome, aos cofres da Previdência Social.

Para a compensação do valor retido, aplicam-se as condições impostas pela Instrução Normativa RFB nº 1.300, de 20 de novembro de 2012 (“Instrução Normativa nº 1.300/2012”). Para a realização da compensação, há necessidade que a retenção previdenciária esteja (i) destacada em nota fiscal; e (ii) declarada em Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social (“GFIP”) na mesma competência de emissão da nota fiscal.

Além disso, estabelece a Instrução Normativa RFB nº 1.300/2012, em seu artigo 60, parágrafo 1º, que a compensação da retenção poderá ser efetuada somente com as contribuições previdenciárias incidentes sobre a folha de salários, não podendo absorver contribuições destinadas a outras entidades ou fundos.

Nesse contexto, conforme disposto na legislação específica, a retenção previdenciária de 3,5% (Lei n° 12.546/2011) poderá ser compensada, pela empresa cedente de mão de obra, quando do recolhimento das contribuições destinadas à Seguridade Social devidas somente sobre a folha de pagamento dos segurados a seu serviço. Restando saldo em favor da empresa cedente de mão de obra, esta poderá compensá-lo nas competências subsequentes, devendo ser declarada em GFIP na competência de sua efetivação, ou requerer a sua restituição (parágrafo 3º, do artigo 60 da Instrução Normativa RFB 1.300/2012). Esse foi inclusive o entendimento adotado pela Receita Federal, por meio da Solução de Consulta n° 66, de 6.12.2012[1].

No entanto, cabe ressaltar que, em consonância ao disposto na legislação específica, a retenção previdenciária de 3,5% (Lei n° 12.546/2011) não poderá ser compensada, pela empresa cedente de mão de obra, quando do recolhimento das contribuições sociais incidentes sobre a receita bruta. Nessa situação, caberá ao contribuinte optar pela restituição.

Quanto ao tema, a Receita Federal do Brasil já se posicionou no sentido de não permitir a eventual compensação dos valores retidos à alíquota de 3,5% com os valores recolhidos da contribuição social incidente sobre a receita bruta, conforme Solução de Consulta nº 50, de 23 de agosto de 2012[2].

Enfim, diante da impossibilidade de compensar o valor da retenção previdenciária de 3,5%, com a contribuição social sobre a receita bruta, resta para o contribuinte adotar a alternativa da restituição via programa Pedido de Restituição, Ressarcimento ou Reembolso e Declaração de Compensação (PER/DCOMP), que elimina toda a praticidade e agilidade do processo de compensação da contribuição previdenciária (efetuada por meio da simples declaração em GFIP), haja vista que a restituição via PERD/DCOMP exige prévia análise e deferimento pela Receita Federal do Brasil, que poderá condicionar o reconhecimento do direito creditório à apresentação de documentos e ao exame da escrituração contábil e fiscal do contribuinte.

Conclusão

Nesse contexto, embora a Lei nº 12.715 /2012 tenha trazido uma redução na alíquota da retenção previdenciária de 11% para 3,5% para algumas empresas, por outro lado, não criou meios para que esse valor retido pelas contratantes seja compensado de maneira eficaz pelas empresas cedentes de mão de obra.

Portanto, tendo em vista atual posicionamento da Receita Federal do Brasil, as empresas cedentes de mão de obra e sujeitas exclusivamente ao regime da desoneração da folha de salários, por não terem o recolhimento sobre a folha de pagamentos mensalmente, poderão eventualmente requerer a restituição do valor retido via PER/DCOMP, o que, todavia, é mais moroso do que o procedimento de compensação.



[1]“(…) As retenções de que tratam o art. 31 da Lei nº 8.212/1991 e o § 6º do art. 7º da Lei nº 12.546/2011 podem ser compensadas, pela empresa cedente de mão-de-obra, quando do recolhimento das contribuições destinadas à Seguridade Social devidas sobre a folha de pagamento dos segurados a seu serviço. (…)”

[2]“(…) A retenção de que trata o art. 31 da Lei nº 8.212/91, pode ser compensada, pela empresa cedente de mão-de-obra, quando do recolhimento das contribuições destinadas à Seguridade Social devidas sobre a folha de pagamento dos segurados a seu serviço, não havendo previsão legal para a compensação da referida retenção com a contribuição substitutiva instituída pelo art. 7º da Lei nº 12.546/2011, incidente sobre a receita bruta. Restando saldo em seu favor, a empresa poderá compensá-lo nas competências subsequentes ou pedir a sua restituição.(…)”

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